sexta-feira, 15 de março de 2019

A “Ordem” Necessária para Ser Criativo (Pepe Sanchez)


Sobre um contexto que na base seja repetitivo, no sentido em que tem princípios de interacção orientadores, o que facilita a manifestação da criatividade.

Não devemos permitir que a criatividade seja fruto exclusivo do acaso ou que a genialidade dependa da anarquia e da aleatoriedade genética/contextual. A criatividade precisa de liberdade, mas não de anarquia, necessita de uma ordem onde determinadas coisas sejam previsíveis e que se repitam no tempo muitas vezes, para que, depois de lidarmos com essas regras como lidamos com a respiração, possamos criar e inventar.

Essencialmente, a liberdade de que precisa é a de errar. Ken Robinson refere que “errar não é o mesmo que ser criativo, mas se queremos ser criativos temos que estar preparados para errar”. Ora, a criatividade terá muito que ver com a relação entre o “lidar com a ordem”, aquilo que se repete (princípios de interacção) e o lidar com a possibilidade de errar na tentativa de criar soluções (não servirá só para jogadores, mas também para treinadores, no fundo para a vida humana no geral).

É mais propício ser-se criativo em contextos onde se pode antecipar, porque quando tens que te adaptar constantemente à novidade e a referências diferentes a cada instante, então a antecipação fica comprometida, pois perdes tempo a descobrir o que estará por detrás do que irá suceder a seguir e por isso dificilmente irás criar algo a partir do vazio. A criatividade necessita dessa estabilidade, dessa constância de determinados princípios de interacção, para que se possa manifestar diversa e dinâmica criando soluções para problemas novos de forma eficiente, eficaz e até surpreendente.

Exercícios novos a cada dia (sem nenhuma conexão com o passado), desviam a concentração para as regras, para o lado estrutural (menos importante) e retiram-te tempo para inventares.

Se um jogador mudasse de equipa constantemente, aconteceria algo parecido, sem entrosamento entre todos e sem referenciais colectivos, onde movimentos, passes, olhares, toques, pé dominante, etc.. coisas que te permitem antecipar o que vai acontecer a seguir, sem isto, a criatividade fica comprometida - é um pouco isto que acontece numa Selecção Nacional.

Numa equipa onde cada jogador age em função de si, sem um "respeito" colectivo, sem interagir e decidir em função dos colegas... isto dificulta muito o aparecimentos da criatividade com sentido. Por isso são tão importantes os jogadores que se movimentam e recebem a bola já a pensar em dar espaço aos demais, promovendo assim uma criatividade colectiva.

Concluindo, necessitamos de uma ordem para antecipar, que de certa forma funciona como base para a criatividade. Inventamos a partir do nosso hábito de agir em determinado contexto previsível, que nós, criando soluções com o nosso saber (proveniente da repetição), tornamos imprevisível na capacidade de aí inovar quando sentimos necessário.


a) extracto do programa: “La pasión según Sacheri” con Pepe Sanchez - 29 de julho de 2018

Sem comentários:

Enviar um comentário