segunda-feira, 3 de junho de 2019

A maior frustração de um treinador


Cada um de nós vive a sua vida para conquistar ou criar algo. São os pequenos avanços (com recuos pelo meio) que nos vão dando alegrias e uma sensação de orgulho. Ver a nossa obra a crescer e a desenvolver-se de acordo com aquilo que vamos fazendo preenche-nos e deixa-nos uma sensação de utilidade que é fundamental para o nosso bem estar.

Ser treinador não é diferente. Ser treinador implica perspectivar cada treino no sentido de construir um jogar que ajude a equipa a melhorar, melhoria essa que está sempre orientada por aquilo que o treinador acredita ser a melhor forma de enfrentar os desafios, ao mesmo tempo pensa como cada jogador pode melhorar para fazer esse jogar evoluir. Tudo isto de forma a poderem disputar o jogo contra qualquer adversário e como consequência poderem competir pelo resultado.

A frustração de qualquer pessoa chega no momento em que, sendo obrigada a colocar em prática aquilo que tem treinado, percebe que as coisas (talvez por não estarem devidamente entranhadas) “não saem” como se pensava que iriam sair. É frustrante quando o que fazemos não condiz com aquilo que tentamos construir diariamente. Antes do resultado, esta percepção de que não há melhoria palpável, este sentimento de que o nosso esforço não produziu a evolução esperada, isto por si é a provavelmente a maior frustração de um treinador/jogador/equipa/pessoa.

Importa perceber que muitas vezes os “resultados” do treino podem não chegar no imediato, para que não se perca a crença no que se faz todos os dias – por vezes os ganhos do nosso trabalho só se vêem mais tarde. Por outro lado deve-se sempre pensar no que está por detrás dessa falta de correspondência entre o que se treina e o que se joga. E isto é responsabilidade de todos, perceber o que está a atrasar o processo e o que pode ser feito no sentido de irmos construindo um jogo cada vez mais completo e consistente ao longo do jogo inteiro.


a) Conferência de imprensa (pós-jogo vs Bournemouth) de Sarri ao serviço do Chelsea FC - Premier League 2018/2019 – jogo que os “Blues” perderam por 4-0

quinta-feira, 30 de maio de 2019

A dor não deve ser suprimida, nem nos deve suprimir


Está a chegar a final da Liga dos Campeões que irá colocar frente a frente Liverpool e Tottenham. Imensos (alguns vá!) “dramas” ocorreram nesta edição. Um deles foi forma como se deu a eliminação do Manchester City, precisamente contra a equipa de Londres, que estará na final.

Este episódio em que Guardiola abordou a forma de encarar este momento “doloroso” é algo que cada vez mais nos deixa convencidos de que o Futebol é uma extensão da vida, é a possibilidade de vivenciarmos tanta coisa num curto espaço de tempo em treino e no dia do jogo - alegrias, amizades, frustrações, dor, conflictos, superação, etc..

Ignorar ou suprimir a dor é um erro, superar a dor é uma coisa, mas suprimi-la como se nada tivesse acontecido é perder uma hipótese de aprender com ela e de nos melhorarmos com essas aprendizagens. Por outro lado não devemos deixar que essa dor nos suprima, porque há mais na nossa vida para além daquilo que nos provocou essa dor.

A sociedade mais um vez está enclausurada numa expectativa de que os maus momentos são para ser ultrapassados dum dia para o outro como se nada tivesse acontecido, mas a verdade é que aquilo que nos provoca dor leva tempo a ser ultrapassado, mas nunca, nunca, nunca deverá ser esquecida. Aquilo que nos marcou durante a vida, ainda que por vezes possa não ser recordado através duma imagem, arranja sempre uma forma de deixar impresso no nosso corpo algo que mais tarde nos será útil, por já termos vivido experiências semelhantes. Isto é uma ajuda tremenda, quase como uma vacina que nos deixou anti-corpos no organismo, prontos para agir quando detectarem a presença do mesmo “problema” que os “criou”.

Por isto é que retirar as dores naturais dos maus momentos da vida de uma criança, de um jovem é um erro que está muito em voga, a medicação e o não darmos tempo para que arranjem formas de ultrapassar essa mesma dor é impedir que criem esses tais anti-corpos. Mais tarde irão sorrir de novo e certamente enquanto a dor não é ultrapassada faremos tudo o possível para os ajudar a continuar a viver, mas nunca suprimir a mínima dor com comprimidos/com distracções constantes que nos impedem de sentir e de viver realmente tudo aquilo que nos aconteceu.


a) Conferência de imprensa (pré-jogo vs Tottenham) de Guardiola ao serviço do Manchester City FC - Premier League 2018/2019 – após a eliminação nos quartos de final da Liga dos Campeões, também frente ao Tottenham

sábado, 25 de maio de 2019

"Pode-se escolher como jogar, mesmo quando se perde?"


Esta é a pergunta que tanto atormenta o futebol, no geral, e aqueles que gostam de ver os seus clubes ganhar, em particular.

Referir que duas semanas após esta conferência Berizzo acabou (“inevitavelmente”) por sair do Athletic de Bilbao, após a sua saída a equipa obteve muitos melhores resultados e escalou na tabela classificativa a ponto de quase alcançar um lugar europeu. Mas como acreditamos que se aprende de toda gente, mesmo de quem perde, aqui fica a nossa reflexão sobre este assunto.

Como se contraria o insucesso? "Sem rumo" é a solução? Qualquer rumo? Sem sentires no fundo da tua alma aquilo que vais ajudar a construir? Será que quando perdes constantemente te podes dar ao luxo de jogar de uma determinada forma, de ter um estilo de jogo e continuar a fazê-lo crescer? (aqui encontram uma das possíveis responstas a esta questão) Nesses momentos parece o que se deve fazer é "ganhar de qualquer maneira", mas o que é isso exactamente? Como é que se treina/joga para se "ganhar duma maneira qualquer"?

Treinar/jogar é sempre no sentido de melhorar e isso implica haver algo que oriente esse processo. Portanto, "qualquer coisa serve" não fará muito sentido. Se depois, no jogo, a vitória acontece de forma fortuita e pouco condizente com o estilo para o qual nos dirigimos (a tal intenção), não deixa de ser festejado, porque todos os treinadores querem ganhar, mas lá estarão no treino seguinte a melhorar a equipa de acordo com os seus princípios de jogo e não é um resultado fortuito que lhes tolda o ver o quão longe a equipa está do ideal. Porque é disso que se trata, de melhorar para ganhar de uma determinada maneira e não duma maneira qualquer (tal como no último post assinalámos usando o exemplo do Vitória SC de Luís Castro).

Eduardo Berizzo, preferiu manter-se no caminho em que acredita, com os seus valores e princípios, do que ser incoerente. Estará errado em tudo porque perde?

O insucesso de alguém dá-nos o atrevimento para interferir e dá uma segurança (insensata) de que a nossa opinião é válida perante o fracasso do outro. Coloca-nos em pé de igualdade com quem perde.

A ideia do treinador (no geral) e as características dos jogadores (no pormenor) dão o rumo a seguir, trair isto é abdicar do sentido que guia a equipa e isto dificilmente levará à vitória. Devemos até ter em conta que cada treinador vê nos mesmos jogadores possibilidades diferentes, condicionados que estão pelas suas experiências passadas e pela forma como foram idealizando o jogo na sua cabeça. A vontade de ganhar tem que estar sempre articulada com a forma de o fazer. Preocupante é quando o fim justifica "qualquer maneira".

"Se não sabes para onde vais, qualquer caminho serve." Lewis Carroll


a) conferência de imprensa pré-jogo de Eduardo Berizzo ao serviço do Athletic de Bilbao durante a época 2018/2019
 
P.S. Fascinam-nos aqueles treinadores que mesmo nas dificuldades e nos maus resultados se mantém fieis aos seus princípios (no jogo e no carácter). Daí esta reflexão. Pena que poucas vezes no futebol se vê um treinador (junto com os jogadores… e todo um clube) ter oportunidade de dar a volta a uma situação complicada, pois ninguém dá tempo para que isso suceda, à mínima dúvida já está tudo à espera da solução "inevitável" (que já é cultural) e que promove a desistência para se recomeçar de novo. Faz-nos pensar no que é verdadeiramente essencial, porque nos maus momentos é a isso que nos devemos agarrar. Num momento de tantos conflitos torna-se ainda mais importante conseguir distinguir o essencial do acessório, estabelecendo prioridades e arranjando soluções, este contexto de dificuldade sem dúvida que tem tanto de aliciante como de difícil. Daí que estes exemplos fossem um grande motivo para aprendermos... todos.

terça-feira, 21 de maio de 2019

O Caminho faz-se caminhando...


Luís Castro – O discurso em sintonia com o percurso

As palavras podem ser muita coisa... por vezes leva-as o vento dada a sua leviandade, outras vezes procuram esconder a verdade, mas também podem ser uma manifestação sincera das nossas intenções, ainda que não se manifeste essa intenção na acção, no imediato.

O tempo, para Luís Castro, tem-se traduzido num grande crescimento como treinador e é um daqueles casos em que o discurso (intenção-ideia de jogo) está em completa sintonia com o percurso (acção-jogar das suas equipas).

Para nós é claro que aquilo que pretende se vê como intenção desde os primeiros jogos da sua equipa, mas há algo fundamental e que por muitos é confundido com incoerência das ideias. Muita gente se manifestou contra escolhas ("já se está a vender em função do resultado"), porque mais uma vez a pressa cega-nos e não se percebe que criar algo leva tempo, dar um sentido comum a 25 cabeças leva tempo. Já para não falar na perda da espontaneidade que origina a pressa de forçar o aparecer de um padrão, o jogar tem que ser inCORPOrado e não memorizado, tem que ser sentido. Leva tempo, ainda mais em contextos onde não se admite o erro e muito menos o errar sobre algumas ideias pré-concebidas, por se jogar em zonas onde se gera ansiedade em quem não tem controlo sobre a bola - claramente quem está fora pouco controla, ainda que o assobio e o “não jogues aí” sejam uma tentativa de controlar algo que se está a tentar criar em treino, quase como que um tentar destruir aquilo para o qual se anda a trabalhar e isto é algo com o qual se deve contar e por isso se deve preparar com treinos no limite onde o risco se sinta como tal e se trabalhe para alcançar a segurança em qualquer zona do campo. É precisamente para isso que cada exercício existe, para criar uma estabilidade naquilo que é o jogar que o treinador pretende que a equipa alcance.

Luís Castro, nunca abdicando das suas ideias, soube equilibrar a sua interferência na equipa. Ou seja, não procurou mudar tudo à pressa nem à pressão, mas ao mesmo tempo notou-se que desde o início do processo o caminho se fez no sentido do jogar que pretende para este (também) seu Vitória SC.

A escolha do 11 sempre respeitou aquilo que a equipa necessitava em função do que já tinha alcançado em termos de jogo (notou-se essa intenção clara). Ou seja o jogo vai-se construindo com jogadores e sendo pessoas são fruto de experiências e é na repetição que a cultura se vai instalando, alguns treinos criam alguma coisa, mas não são suficientes para criar nada tão complexo, portanto é preciso ir vendo como está o jogo e que estabilidade ele tem e que jogadores precisa para colmatar a falta de fluidez em determinados momentos e ir vendo se alguns jogadores funcionam bem com outros, tendo em conta o jogar actual (que efectivamente a equipa joga).

Pareceu-nos que as suas primeiras prioridades para controlo do jogo foram na tentativa de dar equilíbrio à sua equipa por forma a impedir o adversário de ser vertical no momento de perda. Indicadores claros de que o caminho se faz caminhando, mas como qualquer construção requer tempo e mesmo depois de se alcançar a dita estabilidade muito tem que se continuar a aprender para nos mantermos estáveis, algo que ao longo da época se percebeu que não é coisa fácil. Ganhar dá-te tempo e dá crença naquilo que se faz, é óbvio que o resultado como que dá ritmo ao processo, por isso mesmo é necessário que o jogar se construa a ganhar. A forma como entendemos isto, é que nunca o jogar pode ser comprometido pelo ganhar, nem o ganhar pode ser comprometido pelo jogar, porque um contribui para o alcançar do outro… vida de treinador é viver com a sua ideia de como ganhar, num jogo onde tem que convencer “25” jogadores das suas ideias. O treino é a melhor forma de se convencer o grupo, porque os prepara (consciente ou inconscientemente) para que se sintam capazes de ir cumprindo com aquilo que é a proposta de jogo do treinador.

Fica então um vídeo onde o discurso demonstra aquilo que foram as intenções do Mister Luís Castro e da sua equipa técnica ao longo da época 2018/2019. Ficamos a perceber um pouco daquilo que foi o caminho, com altos e baixo, mas em crescendo, até ao jogo contra o Moreirense que permitiu subir ao 5º lugar. Fica bem patente que para alguns treinadores/jogadores o resultado faz mais sentido quando alicerçado num jogo que une toda a gente em torno de um jogo de qualidade.


a) conferências de imprensa pré- e pós-jogo de Luís Castro ao serviço do Vitória SC durante a época 2018/2019

domingo, 19 de maio de 2019

A intuição e a intenção


Sempre que nos preparamos para algo, ou seja, em qualquer processo de aprendizagem o que se pretende é transformar a informação (que importa) que nos entra corpo adentro, através dos sentidos e da experimentação, em inteligência e saber, que criam uma capacidade de priorizar em função do "aqui e agora", que mais não são as circunstâncias que requerem de nós decisões/soluções para problemas ou para o evitar destes... antecipando.

O que acontece é que durante um jogo, e até mesmo durante um treino, o presente toma conta e todo o caos emerge, obrigando-nos a tomar decisões, ora isto requer decidir em milisegundos. No fundo é necessário que se decida mesmo antes de tomarmos consciência da necessidade de termos que decidir, e é aqui que entra a intuição... estando longe de ser anárquica, é muitas vezes difícil de entender e até de explicar.

Qualquer decisão tem um sentido, ainda que se baseie em emoções momentâneas, fruto de experiências mais ou menos recentes que nos marcaram, que em determinado momento (no "aqui e agora") nos depertaram para algo do que nos envolve/rodeia e desencadeando assim uma decisão e acção.

O que se pretende é que a intuição seja coerente com aquela que é a nossa intenção prévia para determinado jogar. Porque a nossa intuição manifesta aquilo que são as nossas prioridades (no momento) e a nossa inteligência (contextual), estando isto relacionado com aquela que é a nossa identidade de jogo, aquele que é o nosso conhecimento dos jogadores que temos (ou colegas de equipa no caso de quem joga), o conhecimento do nosso adversário, etc.

A nossa evolução enquanto treinadores (e jogadores também) deve passar sempre por chegar à máxima coerência (possível) entre a intenção prévia e a intuição que nos leva a decidir em tantos momentos que não “controlamos” de forma consciente.


a) entrevista de Pep Guardiola à BBC Sport no decorrer da época 2018/2019

quinta-feira, 16 de maio de 2019

Anti-(Cultura de anti-superação)


Se há coisa que procuro diariamente são exemplos de superação, de gente que transcende a dificuldade e os maus momentos, gente que se agarra ao que de bom ainda existe para solucionar e atenuar os defeitos que com o tempo aparecem, mas aquilo que se vê é gente que quer apagar o passado e o presente esquecendo as perspectivas que se tinham para o futuro.

Inspiram-me pessoas, casais, famílias, grupos, equipas, povos, gente que na dificuldade se une para superar as adversidades para seguir um caminho com esperança num futuro melhor, ainda que no caso do futebol isso possa não ser o suficiente para se alcançar os objectivos. Até que ponto damos verdadeira oportunidade para que mais casos destes surjam? Que espaço há para “cair e levantar com mais força”?

Todos sonhamos com uma vida cheia de momentos desses, momentos onde toda a gente junta encontra soluções para poder resolver grande parte dos problemas que nos empurram para baixo. Mas nem sempre a realidade nos dá estes exemplos, o que é acontece tantas vezes é que quando surje uma dificuldade, uma crise, uma dúvida, um momento em que parece não haver um rumo, depois duma desilusão… a coisa resolve-se com o afastamento de quem é responsável. Não se trata de defender treinadores, trata-se de preferir ver gente que se une na dificuldade, do que ver afastar-se gente na "tempestade que vem após a bonança" (nem era bom que a ordem das coisas fosse linear).

Guardiola esteve a 7 pontos do Liverpool e certamente não se vivia tranquilamente em Manchester (city), certamente houve quem duvidasse, mas todos se uniram agarrando-se à pequena chama da esperança. Isto não se consegue só às custas da inspiração de um grande líder, é necessário um determinado tipo de gente que assuma a liderança de si próprio e de quem os rodeia, todos têm que ser responsáveis por inspirar/cativar. O líder também busca, muitas vezes, essa inspiração nos jogadores que lhe mostram que estão ali para dar a volta por cima a cada dia.

Sempre que me vem à cabeça a palavra “superação” recordo-me de Vítor Pereira e das suas épocas no FCPorto. Um Homem que teve que superar o “catálogo” que tinha de adjunto para poder criar uma cultura, uma equipa dominadora e que sempre tentou solucionar o jogo pela busca da bola, com garra sim, mas com muito jogo… e conseguiu-o num clima de dúvida diária.

Jorge Jesus, que perdeu tudo pelo SLBenfica nas duas últimas semanas da época 2012/2013, é outro grande exemplo. Tinha uma equipa destruída naquela final da Taça, com jogadores em conflito e dessa queda frustrante levantou-se gente capaz de criar uma equipa feliz a jogar.

Isto é impossível sem os tais jogadores (e toda a gente do clube) que “inspirem” o treinador, jogadores que se deixam guiar e que ao mesmo tempo guiam os companheiros que se mostram com mais dúvidas. O Líder tenta cativar para as suas ideias, mas sozinho não é nada, precisa que todos queiram e acreditem que é possível criar novos laços quando parece só haver um vazio à nossa frente.

Não nos habituemos a este clima de anti-superação que ganha vida na “chicotada-psicológica”, tentemos juntos. Não esperemos o afastamento de uns e a chegada de outros para tentar. Tentemos todos os dias para que consigamos continuar unidos e seguir com todos até ao fim. Este é o meu sonho: que não se quebrem os laços que outrora nos fizeram sonhar por um momento de dúvida.

segunda-feira, 13 de maio de 2019

Guardiola e a pergunta esperada!


Agora fala-se de recordes e do lindo que é o sucesso de treinadores, de jogadores, e de todo o staff de um clube, mas aqueles que hoje ganham (e perdem) percorreram um caminho... o deles, melhor ou pior, com altos e baixos... o fundamental é que sintam que esse foi o caminho que escolheram, aquele que quiseram percorrer independentemente do resultado final, mas sempre pensando que esse seria o percurso que os aproximaria do triunfo e do crescimento.

Ora, há uns meses Manchester city estava a 7 pontos do Primeiro classificado (Liverpool), condenado a entregar o campeonato caso nada mudasse na forma como procuravam disputar o jogo. Nessa altura surgiu a inevitável e previsível pergunta, que nada mais é que o espelho duma sociedade superficial e com um pensamento que, de tão linear, reduz o potencial de transcendência que temos dentro de nós. Urge maior diversidade para que haja mais alternativas e assim espaço para quem valoriza mais o que é feito sem espera que surja o resultado.

Vencer é o raro, não o comum. Ser o melhor mais vezes do que aquelas em que não se é o melhor, é algo raríssimo (se é que existe... durante uma vida inteira). Portanto, o essencial é melhorar sempre, isso está ao alcance de todos, ao passo que vencer (no sentido de ser o Primeiro) está ao alcance duma minoria. Em centenas de equipas que integram todas as divisões do futebol Inglês, por exemplo, só uma vai ser "a melhor". Portanto, vencer é para UMA só, mas melhorar tem que ser para todas, e temos que encontrar motivos para melhorar tanto nas vitórias como nas derrotas (o caminho é tudo e tem de tudo).

Dito isto, vencer não pode ser um medidor da qualidade dos estilos, vencer (no máximo, se tudo correr bem) é o medidor da qualidade das equipas, dos seus jogadores e da forma como jogaram numa determinada época.

Vamos lá imaginar que toda a gente jogava segundo um só estilo e só existia um tipo de jogador, ainda assim só um ganharia. 20 equipas com um só estilo implicava (na mesma) ter 19 equipas a fracassar, e só uma a vencer. O fracasso desse estilo seria muito maior do que o triunfo (19 - 1, goleada das antigas).

A questão é: o que resta aos normais? No fundo, o que resta aos treinadores (humanos) que perdem mais títulos quando comparado com o número de títulos que ganham? (Ou seja todos os treinadores). Se todos queremos ganhar mas quase ninguém ganha, o que é que nos move?

Consideramos duas coisas fundamentais:

- a superação que se reflecte na procura de soluções para os problemas (do jogo, essencialmente) que geram aprendizagem e por isso desenvolvimento;
- as crenças (que se traduzem em princípios/valores que definem aquilo que nos guia) que são fruto das nossas experiências. As crenças vão-se aperfeiçoando desde que não deixem de orientar o processo de crescimento (da forma de jogar da equipa).

Estas são duas condições fundamentais e que devem ser à prova de bala (neste caso de derrotas ou de dificuldades), tal como Guardiola fala.

Melhorar implica uma mudança, mas melhorar não é mudar. Porque procurar soluções para aquilo que não fazemos bem não implica mudarmos aquilo que é o nosso estilo ou a nossa essência, é simplesmente corrigir erros. Mudar de crenças/de ideias/de filosofias (que no fundo são também muito de que nos caracteriza) é perder o rumo e assim sendo é deixar o processo entregue ao aleatório e à anarquia. Porque saltitar entre "crenças" é não ter crenças nenhumas, é perder sentido da nossa missão e é perder a capacidade de orientar o processo. Neste caso, o que nos moveria e segundo que perspectiva iríamos ver o jogo para procurar o porquê de ganharmos e porquê de perdermos?

A crença é o que nos mantém no caminho do desenvolvimento independentemente das dificuldades e dos obstáculos. A superação é aquilo que nos permite melhorar a cada momento do processo e assim aprender a melhor ultrapassar os obstáculos. Assim sendo ambas nos colocam mais perto de ganhar.

Sem crenças (algo que nos define e guia no jogo e na vida) e sem a vontade de nos superarmos seria uma questão de tempo até que tudo deixasse de fazer sentido, para nós e para quem nós orientamos.

A pergunta que deveríamos fazer a nós próprios em momentos difíceis não é aquela que foi feita ao Pep, deveria antes ser a seguinte: Como e em que é que eu, com as crenças que me definem e me dão uma tendência para resolver os problemas do jogo de uma determinada forma, posso CONTINUAR a melhorar a minha equipa e os meus jogadores?


a) Conferência de imprensa (pré-jogo) de Guardiola ao serviço do Manchester City FC - Premier League 2018/2019