quarta-feira, 17 de abril de 2019

Viver à pressa é viver menos!


Não importa se é o Vinicius, o Quim o Zé ou o Manel. O que queremos é alertar para esta vertigem da pressa em que a nossa sociedade vive imersa. A pressa de chegar, a pressa de alcançar, a pressa de estar pronto, a pressa que rapidamente se transforma em pressão pela expectativa exagerada que se cria. Que não se confunda esta reflexão com o preconceito da idade, nem vale a pena deturpar, porque não se trata de nada parecido com isso.

Podíamos até falar daquilo que o Ajax (ou Barcelona) faz, mas o tema não é bem esse. O Ajax é um caso de um processo transversal a todas a equipas (escalões) do clube e que sobretudo prova o poder da especificidade e como ela favorece o aparecimento do talento e ajuda e muito à sua inclusão em níveis altos sem se dar por isso. A especificidade é esse contexto que dá sentido a determinado jogador e assim sendo deixa de ser apressada a inclusão do jovem para passar a ser uma consequência natural do processo de formação.

Ora em milhares de casos não é isto que se verifica, o que acontece é uma pressão social para que se dê a integração de juventude. Importa por isso perceber que a ambição equilibrada é aquela que gera compromisso diário sem gerar pressa, porque "a pressa é inimiga da perfeição" e quem quer andar a top tem que andar lá perto todos os dias, nos treinos, nos jogos, na mentalidade de quem se implica todo em cada momento útil para o desenvolvimento.

O culto da juventude existiu sempre, desde a procura da formula para o elixir da juventude até ao negócio do futebol que faz emergir a pressa do contracto milionário. Chega-se ao ridículo de se valorizar o trabalho de treinadores só porque deu uns minutinhos a um jovem (17 ou 18 anos) da formação. Isto por si só chega? A formação é muito mais do que dar uma oportunidadezinha isso é só um passo de um longo crescimento que se tem pela frente.

Nunca como hoje se deu tanta oportunidade aos jovens no futebol, nunca como hoje tantos jogadores ganharam tanto dinheiro com o futebol e ainda assim nunca tanto como hoje se exigiu oportunidades para os jovens... à força – é necessário perceber o contexto, que no caso do Ajax leva anos... claro que é possível, mas não se pode ignorar o “aqui e agora” e exigir aposta na formação a clubes que nem pensam sequer em preparar-se para criar uma identidade transversal dentro do clube desde os sub7 até à Equipa A, forçar a inclusão de miúdos da formação que vêm duma especificidade completamente diferente daquilo que é o jogo da Equipa A, é só ridículo. No entanto há muita pressa espalhada por aí neste sentido, muito lamento perdido, precisamente por se ignorar a realidade.

Há algo grave que advém daqui: usa-se muito a desculpa da carreira curta para convencer os jovens jogadores de que se não tiverem a oportunidade agora, ela pode nunca mais surgir. Mas as carreiras nunca foram tão longas e nunca se ganhou tanto dinheiro em tão pouco tempo de carreira (contextualizar com o nível de que estamos a falar).

"Lançar um jovem" exige sensibilidade para o tipo de mentalidade que tem esse jogador (sem correr o risco de o "lançar às feras"), tanto para lidar com o eventual fracasso, como para lidar com o possível triunfo e "elogio fácil" que poderá surgir no pós jogo. "Nasce uma estrela" que não se quer que seja uma "estrela cadente" que só pára no abismo da frustração ou no deslumbramento do estrelato. Lidar com as emoções das primeiras experiências do futebol sénior necessita de uma grande mentalidade e necessita que o crescimento seja alimentado diariamente por essa mentalidade. Raramente surgem jogadores como Rúben Neves, Bernardo Silva ou João Félix que parecem ter sido "adultos" a vida toda, dado a forma como encaram a sua profissão. Não se pode forçar algo que tem que ser conquistado e preparado com naturalidade.

A culpa é de todos os que exigimos, sem perceber que conquistar/manter as coisas tem que dar trabalho e que se trata de um processo de contínua formação e amadurecimento, que está muito para além do que se faz no jogo e tem muito da reação ao que se passa no jogo.

Temos que viver e formar para desfrutar do tempo que temos (que nem é pouco nem é muito, é o que temos), ao invés de fazermos da vida e da formação uma corrida apressada contra o tempo... na ânsia de alcançar nem desfrutamos da viagem, do caminho sem o qual é impossível chegar aos “destinos”. É uma corrida perdida antes de começar, essa contra o tempo, porque o esse arranja sempre uma forma de estar à nossa frente. Acreditem que poucos são os que vivem à frente do tempo. Qual é o problema disso? Nenhum, não há que desesperar por necessitarmos de mais tempo para nos prepararmos, a aprendizagem/desenvolvimento não é uma corrida para ver quem chega primeiro... que se desfrute do tempo, no tentar ser melhor do que já somos.

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