quarta-feira, 27 de março de 2019

"Avaliação aos pais" na hora de recrutar um jogador


Avaliar os pais para recrutar jogadores?! Absurdo ou consequência da falta de autonomia?

Pat Fitzgerald (treinador da equipa de futebol americano da Northwestern University) acerca de questões importantes na hora de oferecer uma bolsa universitária a quem tem capacidade para integrar a sua equipa para competir na Liga Universitária de Futebol Americano (de onde saem, todos os anos, jogadores que "alimentam" as equipas da NFL-Liga Profissional).

Não interessa muito, para entender o tema, se sabemos algo sobre Futebol Americano ou não.

Tudo o que identificamos, no vídeo e nas palavras deste treinador, facilmente poderia ter sido dito por um qualquer Coordenador técnico da Formação de um clube de futebol em Portugal, ou até por um Chefe de Departamento de Scout (da formação ou do futebol profissional).

Que importância se atribui à mentalidade/personalidade de um miudo/jovem/profissional na hora de recrutar/contratar? É que aqui também se vê se vale tudo para ganhar. Queremos ter os melhores mesmo que os seus valores e as suas escolhas sociais vão contra os valores do clube e do que é o respeito pelos outros? O futebol é colectivo, portanto é um contexto onde o individual enquanto parte duma equipa cria/ajuda a criar, com maior ou menor preponderância (dependendo do seu lugar na hierarquia do grupo) uma cultura de valores nessa mesma equipa.

O crescimento, a aprendizagem, o compromisso, a capacidade de transcender o seu potencial, o conceito de "margem de progressão", tudo isto irá ser claramente influenciado pela mentalidade de quem treina, porque o treinador guia, mas quem se treina é cada um dos jogadores, o treinador procura facilitar/inspirar/instigar a aprendizagem, mas quem aprende é o jogador.

Até aqui parece que tudo está claro e sempre foi assim, o concretizar do potencial depende não só do talento, mas também da capacidade que temos para atingir o máximo desse talento com regularidade e durante muito tempo e até transcendê-lo.

Mas há outra questão que se levanta desde que, há uns 15 anos (mais ou menos), se começou a acentuar/promover a falta de autonomia das crianças pela desmesurada protecção (em muitos casos) por parte dos pais, a desresponsabilização dos mais jovens (de toda a gente no fundo, porque há sempre alguém a quem culpar). Isto tudo se nota na forma como hoje os pais querem interferir em todos os contextos onde os filhos estão inseridos, de forma a dar-lhes maior conforto, resolvendo até os problemas sociais por eles. Que repercussões concretas é que isto tem? São mais os benefícios ou as perdas em termos da personalidade/mentalidade das crianças?

A responsabilidade da “não aprendizagem” é exclusiva dos professores que não gostam de determinado aluno, a responsabilidade do miúdo não evoluir é do treinador. Mas alguém tem necessidade de melhorar sabendo que a responsabilidade do seu fracasso está noutra pessoa e não nela própria? Em casa, qualquer palavra dita pelos pais tem tal interferência que os seus filhos a entranham e sentem nela uma linha orientadora para agirem na escola/nos treinos/na vida de acordo com o que ouviram. É (também) aqui que se vê a falta de autonomia, a falta de um sentimento próprio, a falta dos miúdos se conhecerem e terem uma consciência de si próprios, sentido-se parte do processo de aprendizagem que lhes permite conhecerem o que os rodeia e a eles mesmos de forma a poderem interagir de uma forma única e que pode ser melhorada a cada dia. Sentir que aprender depende deles, ainda que busquem inspiração nos outros – professores, pais, sociedade no geral, que deve que ter esta preocupação de inspirar a aprendizagem e responsabilizar.

Por tudo isto, fará todo o sentido que os clubes tenham em conta os pais, a mentalidade, o talento, etc. na hora de recrutar, porque antes de serem jogadores são pessoas e isso importa muito.


a) conferência de imprensa de Pat Fitzgerald ao serviço da Northwestern University, aquando do “Signing Day” 2016 – retirada da conta oficial do youtube “Northwestern Athletics”

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