quarta-feira, 20 de março de 2019

“Deixar-se guiar” como catalisador da aprendizagem! (Quique Setién sobre Aïssa Mandi)


Fala-se muito em "margem de progressão", foi um termo que caiu bem e como quase tudo o que cai bem e cola, rapidamente o conceito passou a ser vulgarmente relacionado, de forma linear pela exclusividade do seu uso, com a idade. Não ignoramos a plasticidade do nosso cérebro/corpo que é inversa à idade e por isso à medida que os anos passam a capacidade de nos moldarmos em função da informação que nos rodeia e de incorporá-la vai diminuindo.

Ora dito isto, não deixa de ser também verdade que, em função da nossa mentalidade, poderemos ter maior predisposição para nos “deixar-mos guiar”, no sentido de tentarmos aprender sempre qualquer coisa, principalmente, de alguém que poderá acrescentar-nos algo. Ainda mais se tivermos em conta que a função dessa pessoa (desse “alguém”) é também a de orientar as "ideias" que cada jogador tem na cabeça, através de referenciais colectivos, de maneira a que se chegue a uma forma de jogar comum, falamos do treinador, como é óbvio, ainda que esteja longe de ser da sua exclusiva responsabilidade o processo de aprendizagem.

Quanto ao estarmos receptivos a perceber (ou pelo menos, tentar) o que se pretende de nós dentro de determinada organização/equipa, não sabemos se será a humildade (como se costuma dizer) aquilo que nos permite ir melhorando a cada experiência, a cada informação que nos é transmitida, sabemos sim que é necessária uma vontade enorme de ser melhor e que treinando no limite e de mente aberta para a ideia de quem lidera se estará sempre mais perto de melhorar.

Vivemos num tempo onde este “deixar-se guiar pelo treinador” parece que é "dar parte fraca", que é como que um "abdicar daquilo que eu sou enquanto jogador", que é “prescindir da minha criatividade” (não se deve confundir ser criativo com “ser diferente só porque sim”), mas entendemos isso de outra maneira, deixarmo-nos treinar por alguém que pretende ligar-nos ao que nos rodeia, fazendo com que os jogadores interajam segundo princípios comuns, é sinal de inteligência e requer uma predisposição para sentir e/ou entender a ideia, para que a possa executar como tendo sido criada por si próprio, e no fundo é mesmo, porque depois de a entendermos e incorporarmos introduzimos a nossa criatividade que acrescenta sempre muito àquilo que absorvemos . Ora, isto requer alerta constante de cada célula do nosso corpo a cada exercício e uma receptividade enorme (tal como Quique Sétien refere que Mandi tem).

Falamos muito destas questões da mentalidade aqui, porque sabemos que isto depende muito daquilo que no treino não se pode controlar tanto, que é a educação. Entendemos que a educação deve ser orientada para que as pessoas vivam no sentido de se melhorar naquilo que as apaixona e ao qual decidiram dedicar a sua vida (ou vários anos dela), seja no futebol ou noutra coisa.

Grande exemplo de Aïssa Mandi, que pode servir de inspiração para termos gente mais comprometida com a aprendizagem e com o sentido de se melhorar, fazendo-o por si (em primeiro lugar), mas sempre com a consciência de que isso irá ser uma grande ajuda para quem joga ao seu lado.

Que sentido terá a nossa vida se não a aproveitarmos para, fazendo aquilo que nos apaixona, nos melhorarmos a cada dia? Não olhemos à idade (ainda que a carreira de jogador tenha um "prazo" mais curto), o que necessitamos é de uma "mentalidade progressiva" virada para a aprendizagem, e isto tem pouco que ver com as "margens de progressão" lineares, baseadas na data de nascimento.


a) visita de Quique Setién ao Campo de Verão (2018) da Academia do Real Racing Club

Sem comentários:

Enviar um comentário