segunda-feira, 1 de abril de 2019

A singularidade do corpo, do jogador e da equipa


Dá-nos a sensação de que os corpos dos jogadores de futebol são cada vez mais idênticos entre si (à excepção dos excepcionais), e até entre praticantes de diferentes desportos o corpo parece caminhar no sentido da uniformização.

Não se deveria perder a especificidade corporal, e para isso é preciso respeitar as diferentes agilidades e graus de liberdade necessários para cada desporto e até (dentro do futebol) para cada estilo de jogo. Ou seja, haverá uma agilidade Específica para praticar determinado desporto, no Futebol, para dar exemplo, a bola é manipulada, maioritariamente, pelas mesmas "ferramentas" que nos permitem a locomoção e isto tem que ser levado muito em conta na hora de recuperar, evitando visões como: “os jogadores de futebol são dos desportistas que menos treinam”. Isto é uma clara falta de noção da especificidade da modalidade desportiva em si e do que implica suportar um corpo em cima do que permite colocar uma bola com precisão onde e como se quer. Sobrecarregar e/ou cansar em demasia as estruturas que permitem a precisão do controlo da bola não só aumenta a probabilidade de lesões dada e imprevisibilidade desse controlo, como também gera perda de fluidez corporal que conduz a mais falhas técnicas. Além das particularidades da modalidade há também a especificidade da forma como ela é praticada ou seja como o jogo é jogado (estilo do jogador e da equipa), algo que deve ter em conta a singularidade de cada corpo e a forma de jogar da equipa.

O corpo é fruto de experiências, de acções que começam desde que nascemos (antes até). Geram-se mecanismos musculo-esqueléticos desde que nos começamos a mexer. A própria estrutura e a nossa agilidade são moldadas nas actividades que temos, processo que atravessa a nossa infância, onde a plasticidade é maior. No dia em que mudarmos aquilo que é o tipo de actividade que temos (ou que dermos maior importância/dedicarmos maior parte do treino a fazer algo que não fazíamos), também o nosso corpo mudará ou, caso a plasticidade não permita mudar, poderá "quebrar" (metaforicamente falando) e aí poderemos ter problemas.

A mecânica do movimento e do corpo está de tal forma normalizada que cresce uma certa “uniformopatia corporal”, onde se desenvolveu um vício pela correcção dos chamados “desvios/desequilíbrios” musculares, não digo que em alguns casos não haja necessidade de intervenção, a questão é que neste momento há muita gente que olha para o corpo e em busca das suas “imperfeições” e isto é feito na comparação entre o jogador e um “Modelo Anatómico” e/ou “Modelo Mecânico de Movimento”. Qualquer diferença é para ser corrigida mecanicamente de forma a aproximar a natureza singular do corpo de cada um, numa espécie de robotização muscular. O que seria do Quaresma se fosse um miúdo de 12/13 anos hoje? Com os pés metidos para dentro? Estaria já a tentar corrigir esse “problema”? Muitas vezes subestimamos a diversidade e capacidade que o corpo tem de se “compensar estruturalmente” a si próprio.

O corpo/o jogador são singulares, assim como é cada equipa, esta é a natureza animal e nós Humanos não fugimos a essa regra, é como se fossemos fabricados à mão – únicos e irrepetíveis – portanto não nos tratemos como se fossemos produtos de uma qualquer produção em série, sujeitos a máquinas e movimentos estereotipados/mecanizados com base em estudos que pretendem uniformizar o movimento e o corpo.

Não queremos mudar ninguém, fazemos estas reflexões, porque a nós nos ajudam a sistematizar ideias e eventualmente encontraremos aqui gente que se identifique connosco ou gente que não concordando poderá gostar de confrontar ideias, poderemos até despertar para a reflexão de quem venha até aqui para ler sobre o que nós pensamos sobre o jogo, o treino, a mentalidade dos jogadores e a sociedade (onde o futebol está inserido). Ver "Da Intenção" onde explicamos o intuito da nossa página e aquilo que nos levou a criá-la.

Nota de agradecimento: Tudo o que escrevemos e apresentamos nesta página sentimos como nosso, porque o entendemos e acreditamos ser o caminho para ajudar o futebol e o jogador a crescer. Mas neste caso temos que agradecer à fonte de toda esta reflexão, ao Prof. Vítor Frade. Porque a gratidão nunca é demais para quem tanto contribuiu para a aprendizagem e “insatisfação” diárias.

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